Profissional da medicina, a médica Dra Nicole publicou uma Carta Aberta no início da tarde desta terça-feira (11), denunciando diversos problemas existentes na saúde pública da cidade de Itarantim. Leia a Carta Aberta enviada ao Blog do Edyy;
“Venho por meio deste texto expressar minha insatisfação e denunciar uma série de situações que venho enfrentando em meu ambiente de trabalho. Essas questões têm impactado não apenas meu bem-estar, mas também minha capacidade de desempenhar minhas funções adequadamente.
Para começar, fui transferida de unidades de saúde diversas vezes, de forma arbitrária e sem explicações claras. Essa instabilidade tem gerado um desconforto significativo já que o como médica da família e comunidade, preciso acompanhar periodicamente seus pacientes. Além disso, muitas vezes fui obrigada a ficar além do horário estipulado, tanto durante o almoço quanto após as 17h devido a quantidade enorme de pacientes . Por um longo período fui a única médica a atender por duas equipes, devido a falta de outro médico na unidade de saúde. Várias vezes cooperei com a gestão, em suas diversas feiras de saúde, muitas vezes nos finais de semana, atendi a população de Itarantim à pedido da gestão. Essa carga excessiva de trabalho tem afetado minha saúde e qualidade de vida. A quantidade de pacientes atendidos por turno tem sido muito superior à que é considerada adequada para garantir a qualidade do atendimento. O número elevado de procedimentos e tarefas diárias compromete a minha capacidade de realizar o trabalho com a atenção e a precisão necessárias. Todas essas informações, quantidades de atendimentos, podem ser comprovados pelo sistema PEC.
Recentemente, enviei uma mensagem à coordenação, expressando meu cansaço e desgaste com a situação, esperando alguma compreensão por da mesma, e para minha surpresa, recebi uma resposta ingrata, alegando que nunca me pediram para ficar além do horário ou para trabalhar aos sábados. Essa falta de empatia e profissionalismo é desanimador e desmotivador.
Outro ponto preocupante é a formação de um grupo no WhatsApp, onde as equipes foram divididas, sem nenhuma reunião ou comunicação com as equipes atuantes, levando a falta de informação aos pacientes que são os mais prejudicados, já que não sabem quem é a equipe da sua região. Nunca houve reuniões formais com toda a equipe ou com os médicos para alinhar as expectativas e discutir as demandas do trabalho. Essa falta de comunicação tem gerado um ambiente confuso e desmotivador. Sobre esse episódio, questionei, sugeri uma reunião com a coordenação, onde nunca fui ouvida e tampouco as equipes.
Ressalto aqui para quem não tem conhecimento da legislação de como a Atenção Básica funciona: Em unidades básicas de saúde, recomenda-se que um médico tenha em média entre 1.500 a 3.000 pacientes cadastrados, considerando que o acompanhamento seja bem distribuído e que a equipe (que também inclui enfermeiros, técnicos de enfermagem e agentes comunitários de saúde) possa realizar o trabalho de forma eficiente. É importante também observar que o médico deve ter tempo para realizar um atendimento de qualidade, o que pode exigir ajustes no número de pacientes atendidos dependendo do contexto.
Nas Unidades de Saúde de Itarantim, deveria ter um mapa que fosse visível e claro para que os pacientes tivessem conhecimento da divisão da área demarcada, evitando que procurem serviços que não são responsáveis por sua área, economizando tempo, recursos, promovendo uma maior organização, acesso facilitado e uma melhor experiência no atendimento. Desde o início do meu trabalho na cidade de Itarantim, nunca houve essa divisão das áreas (Territorialização) em nenhuma unidade que atendi.
Além das questões já mencionadas, gostaria de destacar que a gestão tem se comportado de maneira prejudicial à minha imagem profissional. Gestores do município têm denegrido minha reputação, chegando ao ponto de solicitar que pacientes me denunciem e difamando-me nas reuniões com outros profissionais. Essa atitude é inaceitável e gera um ambiente hostil, onde não consigo trabalhar com dignidade. Diante de tais atitudes e posicionamentos nada profissional por parte da coordenação, me vi obrigada a pedir ajuda jurídica, e à supervisão do PMM, onde relatei todos esses acontecimentos. Cheguei também a solicitar uma reunião com o gestor do município, conversei com secretários e algumas autoridades do município. Todos estão cientes de todo esse relato.
Ademais, a troca de coordenadores ocorreu três vezes em um curto período, sempre devido a conflitos com a secretária, o que traz ainda mais instabilidade ao ambiente de trabalho. Para completar essa série de desafios, fiquei quase um ano aguardando a entrega de um simples otoscópio, material essencial para o meu trabalho. A realidade de muitas unidades de Saúde em Itarantim é marcada por uma estrutura inadequada, mesmo após várias reformas; falta de manutenção constante nos equipamentos; é comum encontrar a escassez de equipamentos básicos, como termômetros, estetoscópios, e materiais para exames, o que dificulta o diagnóstico correto. Tudo isso tem comprometido a qualidade do atendimento e a eficiência dos serviços prestados à população. É fundamental que as autoridades de saúde de Itarantim invistam em melhorias significativas na estrutura dessas unidades, priorizando a manutenção.
Todos esses eventos tem causado um desgaste físico e psicológico considerável, com impactos no meu rendimento e na minha saúde mental, o que é preocupante e insustentável.
É importante ressaltar que sou imensamente grata por cada paciente que pude ajudar ao longo desses seis anos. Cada vida que toquei e cada sorriso que consegui trazer são motivos pelos quais sempre amei meu trabalho. Estou sendo desligada da equipe de saúde não por vontade própria, mas pelas circunstâncias impostas. O único motivo que me fazia permanecer era o amor e carinho que sinto pelos meus pacientes. Através dessa carta, quero esclarecer e explicar a todos meus pacientes o motivo pelo o qual estou indo embora de Itarantim. Gratidão eterna só a vocês!
Essas situações precisam ser reconhecidas e abordadas urgentemente. Espero que essa denúncia sirva como um chamado à ação para melhorar as condições de trabalho, que a gestão encontre Secretários (as) mais humanizados, mais empáticos e que tenham conhecimento técnico na área onde irão atuar, para promover um ambiente mais saudável e colaborativo para todos.
Ass.: Dra Nicole”